Comercializar órgãos do corpo humano é crime

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Jesseir Coelho de Alcântara
Jesseir Coelho de Alcântara

Existem até anúncios e tem gente que recorre à internet para oferecer alguma parte do corpo por uma boa quantia em dinheiro. Essas publicações em si já são ilícitas. Essas pessoas estão sujeitas à Lei 9.434/97, que teve sua redação parcialmente alterada pelas Leis 10.211/2001 e 11.521/2007, trata sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento. Elas podem ser presas e condenadas. A lei é clara quando diz que é crime comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano.

A legislação acima, que trata do assunto no Brasil, diz que se o crime é praticado em pessoa viva e resulta em sua morte, a pena de reclusão vai de oito a vinte anos, além de multa (art. 14, §4º). Já o crime que chamamos normalmente de ‘tráfico de órgãos’, não existe. Isso é apenas um termo genérico sem sentido jurídico. O que existe são os crimes de compra e venda de órgãos, tecidos ou partes do corpo humano (art. 15), que tem pena de três a oito anos de reclusão, e multa; e recolher, transportar, guardar ou distribuir essas mesmas partes (art. 17) – pena de seis meses a dois anos de reclusão, e multa – ou realizar o transplante em desacordo com a lei (art. 16): pena de um a seis anos de reclusão, e multa. Há também sanções administrativas na lei.

Configurado o crime, quem, de alguma maneira, promoveu, intermediou, facilitou ou teve qualquer vantagem com a transação sofrerá a mesma penalidade da pessoa que vendeu o órgão.

As pessoas devem saber do perigo que estão passando na mão desses criminosos em virtude desses órgãos, tecidos e substâncias estarem sendo negociados e transplantados na ilegalidade, em clínicas clandestinas e em um ambiente inapropriado. É um crime silencioso envolvendo a coleta e venda de órgãos de doadores involuntários ou doadores que são explorados ao venderem seus órgãos em circunstâncias questionáveis. Esse comércio é um tema muito complexo e com poucos dados concretos.

Fatores primordiais para a prática delitiva são a falta de informação da população, a ausência de políticas de saúde que garantam o acesso por vias não criminosas e a vulnerabilidade do cidadão doente a qualquer opção viável para que sua condição de saúde melhore, numa situação muitas vezes desesperadora quanto ao sofrimento imposto por sessões laboratoriais ou médicas, falta de convívio social, dificuldade de transporte, falta de esclarecimento, etc.

É evidente que nem toda situação de doação de órgãos, tecidos ou substâncias constitui-se em delito. A Lei 10.205/2001 não considera como comercialização a cobrança de valores referentes a insumos, materiais, exames sorológicos, imunoematológicos e demais exames laboratoriais realizados para a seleção do sangue. Existem as necessidades cirúrgicas de transplante para salvar a vida de outrem. Isso é até plausível e humanitário e tem permissivo legal. O que não pode ocorrer e deve ser punido é a comercialização indiscriminada por parte de inescrupulosos ávidos pelo lucro criminoso.

Jesseir Coelho de Alcântara é Juiz de Direito e Professor