
Edemundo Dias de Oliveira Filho
O desafio do pensamento, nessa sociedade dita moderna, onde está em curso a constituição de sociabilidades cada vez mais sistematizadas, é o de conseguir enxergar para além das determinações postas e avançar em consciências mais críticas a fim de que sejam alcançadas as transformações necessárias. Nesse contexto, neste mês de março, mês da mulher, a reflexão que proponho recai sobre uma realidade extremamente dramática: mulher encarcerada.
Sei que o cárcere é o resultado das próprias escolhas de cada uma dessas mulheres enclausuradas, mesmo que essa escolha seja a de um companheiro que tem história no crime. Em Goiás, em meio a uma população carcerária de 689 mulheres, a maioria cumpre pena por ter se envolvido com a criminalidade em meio à relação familiar. Algumas não apresentam o chamado potencial criminoso. Mas, “devem” para a justiça e pagam pelas penas imputadas dentro dos presídios.
Assim, a discussão recai sobre a perda incomensurável, não só no meio familiar, mas para a sociedade como um todo. É fato que, comumente, quando isso ocorre, a família se desfaz, se desestrutura. Isso por que na história de construção de nossa civilização, são as mulheres, tão constantemente obliteradas, o verdadeiro esteio social a dar sustentabilidade a valorações de imprescindível existência. E, mesmo em meio às tão reconhecidas conquistas da mulher nos dias atuais, cada vez mais amplas, o papel de mantenedora do meio familiar não se perderá. Isso é da essência feminina.
Nas estatísticas do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça, em 2006, eram cerca de 70 mulheres presas em Goiás por crime de tráfico. Em junho de 2010, quando o órgão atualizou pela última vez seus indicadores, havia 335 mulheres espalhadas nas cadeias e presídios do Estado por tráfico de entorpecentes. Ou seja, houve um aumento de quase 400% no número de prisões de mulheres, por relação direta ou indireta com o tráfico de drogas.
Numa realidade machista, mesmo quando a mulher deixa o cárcere, o estigma de ex-presa é potencializado pelo fato de ser mulher. E, nesse contexto, a sociedade prova que ainda não está preparada para receber o egresso do sistema prisional contribuindo com a sua necessária reintegração social, haja vista as limitações pautadas quase sempre pelo preconceito.
Na prisão, a mulher vivencia dor martirizante: os filhos que crescem longe do seu seio materno e a tristeza da família nos dias de visita. Algumas, com o passar dos anos, têm seus filhos dentro da unidade penal.
Contudo, temos visto algo que só a mulher, mesmo encarcerada, possui: da fraqueza tira força para manter acesa a esperança. Como diria o pensador A. Ganivet: “A mulher tem uma única via para superar o homem: ser mais mulher a cada dia”.
Edemundo Dias de Oliveira Filho é delegado de polícia, presidente da Agência Goiana do Sistema de Execução Penal (Agsep), escritor e pastor evangélico
Artigo publicado em O Popular, edição de 11.03.12