Pousada Constitu…

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Por Rodrigo Lacerda

(Blog Análise Jurídica)

Hoje quero contar uma estória a vocês. Trata-se de um empreendimento que eu e um amigo decidimos nos arriscar. Chamei esse amigo porque, como se diz aqui, “é o cara”!!! O nome dele é um tanto engraçado, por isso o apelidamos de Constitu.

Você me pergunta: Rodrigo, por que Constitu? Na faculdade era o cara que mais manjava de Constitucional. Qualquer dúvida, o Constitu “era o pressuposto de validade” de nossas pesquisas jurídicas. Vamos ao empreendimento? Foi assim….

Decidimos montar uma pousada para concurseiros e estudantes para o Exame de Ordem em um município do interior de Goiás. E pousada, como já sabemos, tem que ser em um local tranquilo, assim possibilita que seus hóspedes extraiam o máximo de seus estudos, porque foi essa a finalidade de sua criação. Achamos um local… Parecia perfeito…. Até eu perguntar ao Constitu!

– Constitu, podemos iniciar as obras?

– Claro, Rodrigo… mas só depois de tirar a licença ambiental, pois sem ela, praticaremos conduta com alto grau de reprovação social e está fragmentada em norma, tipificando a conduta como infração penal… traduzindo… praticaremos crime, “meu filho”!

Lei 9.605/98, Artigo 60. Construir, reformar, ampliar, instalar ou fazer funcionar, em qualquer parte do território nacional, estabelecimentos, obras ou serviços potencialmente poluidores, sem licença ou autorização dos órgãos ambientais competentes, ou contrariando as normas legais e regulamentares pertinentes: Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

– Licença Ambiental? (Cara de quem fez cinco anos de faculdade e não tinha a mínima ideia do que ele estava falando… rsrsr… normal).

Constitu me explicou que como o empreendimento causaria um impacto ambiental por conta das obras, a Administração Pública no exercício do Poder de Polícia, fiscalizaria por meio de vários instrumentos e órgãos, e um deles e a licença ambiental conforme o art. 10 da lei 6938/81:
Artigo 10. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental. (Redação dada pela Lei Complementar nº 140, de 2011)

Muito bom esse Constitu… hein!!! Outra coisa, ele me disse que a Natureza é um bem de todos… perguntei… e daí? E daí, disse ele, que se é de todos, nós não poderíamos usufruir financeiramente dela e não pagar nada…

– Meus Deus… Pensei! O que você está falando?

Constitu disse que se a natureza é um bem de todos e é essencial a qualidade de vida… ela é um direito fundamental. Rapaz… disse a ele, direitos fundamentais não são só a vida, a liberdade, a igualdade, a propriedade e a segurança? Constitu respondeu rapidamente…. CLARO QUE NÃO!!!! São princípios… e estes devem ter uma abrangência maior possível, segundo Robert Alexy.

Vejamos:“E como mandados de otimização os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, conforme as possibilidades jurídicas e fáticas. Isto significa que podem ser satisfeitos em diferentes graus e que a medida da sua satisfação depende não apenas das possibilidades fáticas mas também das jurídicas, que estão determinadas não apenas por regras, mas também por princípios opostos”. (ALEXY, 1997, p. 162, tradução nossa)

Comecei a ficar irritado… Perguntei… então: Constitu… qual a natureza jurídica do meio ambiente? Ele perdeu dois segundos com um olhar em minha direção (tipo me chamando de homem das cavernas), deu aquele sorrisinho… e disse…

– Doutor (senti um ar de deboche), são direitos fundamentais difusos ou transindividuais.

Isso quer dizer que são direitos fundamentais em que o interesse sobre ele não é coletivo ou individual, como o que ocorre com os direitos de primeira geração (vida, igualdade etc.), ou seja, transcende a individualidade e a coletividade e, portanto, são difusos. São direitos que pertencem a todos, mas não tem destinatário certo. Sendo assim, nós poderíamos montar nossa pousada e, caso víssemos a usufruir do meio ambiente com a finalidade capitalista, pagaríamos por isso, pois, já que o meio ambiente de bem de todos, nada mais justo que nós pagarmos pelo uso a todos. Constitu me ensinou que esse é o Princípio do Usuário Pagador. Legal isso, né? Gostei!!

Ele também disse que, caso conseguíssemos a licença ambiental, o município tem alguns incentivos previstos em lei para quem protege o meio ambiente. Aí deu nó na minha cabeça…

– Quer dizer, Constitu, que se eu proteger o meio ambiente, além de montar a pousada, posso ganhar incentivos do município? Consti enfaticamente disse:

– TENHO QUE DESENHAR PRA VOCÊ ENTENDER? SIM, “meu filho!!!”

Ele disse que esse princípio é conhecido como Provedor Recebedor pago a quem protege o meio ambiente!!!

Agora, simmmm!!!

Sabendo disso, começamos a trabalhar no empreendimento. E Constitu já começou o planejamento jurídico para a solicitação da licença ambiental. Para que isso fosse possível, tivemos que nos perguntar algumas coisas, quais sejam:

1. O que é Meio ambiente?

2. O que é Licenciamento?

Respondendo a primeira indagação: Constitu já conceituou meio ambiente de acordo com o art. 3º I da lei 6398 de 1981 e com a ampliação dada pelo artigo 225 da Constituição Federal.

Esse conceito está na lei 6938/81, lá em seu art. 3º. I. Observem:

LEI Nº 6.938, DE 31 DE AGOSTO DE 1981
Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE

Art. 3º – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas;
Na lei 6938/81, o Meio Ambiente é conceituado somente em na ordem física química e biológica, somente isso!!! O que ocorreu em 05.10.1988? Na promulgação da Constituição Federal, no art. 225, “caput” houve uma ampliação do conceito de meio ambiente…. é, isso mesmo!!! A CF/88 não trouxe um conceito e sim uma ampliação do conceito já existente. Vejamos:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A Constituição ampliou inserindo no conceito o meio ambiente com a seguinte classificação: Meio Ambiente Natural; Meio Ambiente Artificial; Meio Ambiente Cultural; Meio Ambiente do Trabalho.
Esse Constitu é fera… fico me perguntando como ele sabe tanto e eu, que fiz a mesma faculdade, estou só digitando pra ele (rsrsr).
Agora, a segunda pergunta: O procedimento para o licenciamento ambiental tem natureza administrativa e é feito pelo órgão competente para licenciar. A resolução CONAMA 237/97 em seu art. 1º, conceituará o que vem a ser o licenciamento ambiental, estudos ambientais e impacto ambiental regional:
Art. 1º – Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:
I – Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso.
II – Licença Ambiental: ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente, estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental.
Da mesma forma, a Lei Complementar 140/11 conceitua o licenciamento ambiental, atuação supletiva e atuação subsidiária:
Art. 2o Para os fins desta Lei Complementar, consideram-se:
I – licenciamento ambiental: o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental;
II – atuação supletiva: ação do ente da Federação que se substitui ao ente federativo originariamente detentor das atribuições, nas hipóteses definidas nesta Lei Complementar;
III – atuação subsidiária: ação do ente da Federação que visa a auxiliar no desempenho das atribuições decorrentes das competências comuns, quando solicitado pelo ente federativo originariamente detentor das atribuições definidas nesta Lei Complementar.
Ufff… Não sabia que para iniciar um empreendimento haveria tanta burocracia… mas pensando bem… é necessário… sabem por quê?? ?… o nosso meio ambiente merece e devemos reconhecer que nós (as presentes gerações) e nosso filhos e netos (futuras gerações) merecemos um meio ambiente ecologicamente saudável e equilibrado.

Querem sabem se conseguimos a licença?

Semana que vem eu conto como conseguimos, ok?

Até lá!!!